terça-feira, 3 de setembro de 2013

Pós-Graduandos em Libras são avaliados na Uníntese - Jornal das Missões - Santo Ângelo/RS - Brasil


Imagine que você está em um país e não conhece a língua local. As pessoas ao seu redor se comunicam, riem, falam e você não consegue compreender. Como você se sentiria? Pois a vida de Cláudio Henrique Nunes Mourão, Carolina Cormelato Sperb – doutorandos em Libras – e de cerca de 9,7 milhões de surdos no Brasil é assim, segundo o Censo realizado pelo IBGE, em 2010. Cláudio e Carolina são doutorandos e estiveram na Uníntese em Santo Ângelo, para avaliar os acadêmicos do curso de pós-graduação Lato Sensu em Língua Brasileira de Sinais (Libras).

O curso

A partir da promulgação do Decreto Federal nº. 5626/2005, todas as escolas e universidades do País têm a obrigação legal de oferecer Língua Brasileira de Sinais como disciplina obrigatória em todos os cursos de formação de professores e nos cursos de fonoaudiologia. O mesmo Decreto assegura que todo o aluno surdo tem direito a um intérprete.
O curso de pós-graduação em Libras da Uníntese, hoje com turmas em diversas regiões do Brasil, dispõe de formação para o ensino e para a tradução e interpretação da Língua de Sinais. Ainda, tem como diferencial o ensino da língua para que todas as pessoas tenham condições de trabalhar neste mercado. Para esta edição da banca de proeficiência, que aconteceu na sede da Uníntese em Santo Ângelo, estiveram presentes como avaliadores dois representantes da comunidade surda com trabalho de destaque nacional, os doutorandos Carlos Mourão e Carolina Sperb.
Para Cláudio, mais conhecido como Cacau, na maioria das vezes os ouvintes são mais difíceis na avaliação do curso, principalmente quando eles não interagem. “Mas na verdade se não estudarem, vai ser difícil tanto para o ouvinte quanto para o surdo. Aqui o importante é o estudo e o empenho”, relata Mourão.

Família

Cláudio relata que dentro da família há exclusão. “Já aconteceu no almoço de todos estarem rindo e eu lá sem entender nada. Então uma vez levei uma colega e toda a família parou admirada para olhar a gente conversar e eles não nos entendiam” comenta.
Para Carolina a família tem fundamental importância em apoiar e se empenhar em aprender Libras e não forçar a comunicação oral. “Sabemos da influência clínica em usar aparelhos, oralizar. Mas o que realmente facilita a comunicação para o surdo é a Libras. A comunicação oral é muito falha para os surdos, apenas 20% consegue-se compreender, e ainda comandos básicos como água
e banho”, salienta Carolina.

Inclusão Social e Educação

Ensino de qualidade

 Com relação ao sistema de educação no Brasil, Cacau fala que para o surdo a Libras é sua primeira língua, e que devemos modificar o contexto histórico de exclusão do surdo no ensino de qualidade. Para ele a atual metodologia utilizada não traz um aprendizado efetivo. “Durante anos decorei o conteúdo, porque não entendia o que os professores passavam. Depois com a Libras passei a compreender e estudar. Hoje falo 5 línguas: Língua de Sinais Brasileira, Sinais Americana do EUA e Língua de Sinais Internacionais, Português e Espanhol escrita”, afirma o professor.
A participante da banca, Caroline, conta que já começou a vida escolar na escola de surdos, apenas depois de um tempo houve pressão para que ela oralizasse e escutasse, então ela foi para a terapia fonoaudiológica e teve ensino com ouvintes. “Na escola não tinha intérprete e tive muitas aulas de reforço. Infelizmente ainda acontece de os professores promoverem alunos com deficiência e realmente os professores me davam nota. Porém sempre tive o apoio da família para acompanhar o conteúdo. Em uma gincana de matemática na quarta série eu tirei o quarto lugar, competindo com ouvintes. A partir dessa conquista começaram a me respeitar, antes me chamavam de burra ou muda”, comenta Carolina.

Inclusão social

Para Cláudio existem dois tipos de inclusão, a social, que para ele está maravilhosa, e que “aos poucos temos acessibilidade, temos intérpretes, legendas na televisão e há pouco tempo consegui viajar sozinho para a Europa”. Mas com relação à inclusão na educação, ainda está a desejar. “Sou contra a educação que não tem as ferramentas necessárias para aprender;
isso não funciona. Sou a favor da escola bilíngue que ensine as duas línguas, tendo a Libras como primeira língua e a segunda o português. Para que depois possam acompanhar com intérprete no Ensino Médio e na Universidade”, salienta Cacau.
Para a doutoranda Carolina a inclusão tem vários aspectos, como o da proposta do Atendimento Educacional Especializado, de aprender Libras no contraturno. “O aluno acompanha as disciplinas normais durante o dia. Eu não concordo. Porque os ouvintes terão que aprender no horário normal e eu enquanto surda vou ter que vir em outro horário extra para poder aprender algo que é do meu direito”, ressalta Carolina.

Ela afirma ainda que os movimentos de surdos estão aprovando muitos projetos para melhorar a inclusão. “Contudo a inclusão escolar na realidade ainda é deficiente, porque está mascarando o uso da Libras”, comenta a doutoranda.

UPF promove Oficina de Literatura Surda - Passo Fundo/RS-Brasil

Oficinas de Literatura Surda - Foto: Claudio Tavares
Interagir com o espaço visual para se adaptar e descobrir o mundo ao seu redor é uma das características dos surdos, que criaram uma cultura própria, onde a falta da audição não interfere em suas vidas. A surdez, aliás, não é uma deficiência ou doença: ser surdo é uma questão de diferença de idioma, pois a linguagem utilizada é por meio de sinais – a Libras - enquanto a do ouvinte é sonora. A linguagem de sinais torna qualquer pessoa capaz de aprender a se comunicar com um surdo. A 15ª Jornada Nacional de Literatura tem as portas abertas para todos os públicos. Quem é surdo pode sentir-se em casa com a Oficina Literária Surda, ministrada pelo professor Cláudio Mourão, que atua de forma constante junto à educação voltada a surdos.

Mourão faz de suas palestras uma motivação para que surdos possam aprender sempre mais, e, especificamente na oficina, aproveitar a Jornada com todas as coisas boas que ela oferece. A atividade teve início nesta quarta-feira, dia 28, e se na sala 101 do prédio B5, Campus I da UPF, e se estende até sexta-feira, dia 30.

Mourão conhece muito bem seu público alvo: nasceu surdo e começou a se interessar em dar palestras participando de eventos e seminários, e adquirindo conhecimento.  Hoje faz palestras com o intuito de mostrar para os surdos que eles  são capazes de ser quem quiserem, sem limitações por causa da surdez. "Quando eu falo sobre a cultura surda e dissemino isso na sociedade, os jovens surdos podem ver em mim um modelo, não ficando na esfera de deficiência ", conta ele na linguagem de Libras.


As oficinas são voltadas para todo o público e abordam a literatura surda, os benefícios que ela traz, a estrutura dos poemas, narrativas e outros diversos assuntos literários. As atividades são acompanhadas pelas intérpretes de Libras Andréia Mendiola Marcon e Emanuele Dal Asta, voluntárias da Jornada, propiciando que o conhecimento possa ser aprendido até entre os ouvintes que não conhecem Libras. O Setor de Atenção ao Estudante (SAES) é o promotor das oficinas.

Oficinas - Foto pessoal Maria Cristina Ferrari
Alunos - Foto pessoal Monique Reveilleau